Era uma porta enferrujada. E ela entrou.
Porta de
madeira maciça com apontamentos em ferro a representar flores e cornucópias e
um irritante gemer de cada vez que se abre ou fecha.
Bateram suavemente, três toques ritmados, fui abrir, o ranger da porta
acompanhou a abertura da mesma. Abri de forma suave, era ela, com aquele ar
altivo de sempre, nariz mais empinado, talvez. Perguntei-lhe o que fazia ali, o
que queria desta vez, dinheiro?! Provocação, pura e simples?! Baixou a cabeça,
pela primeira vez vi-lhe cabelos brancos junto à raiz, fiquei mais atento e
reparei no cabelo maltratado. Ainda cabisbaixa, disse num tom triste: “Fiquei
sem casa. Não tenho onde ficar, daí estar aqui. Não sabes o que custa, como o
meu orgulho está ferido. Afinal fomos casados doze anos, não me portei bem
contigo bem sei, mas não tinha a quem recorrer.”
- Entra. Disse, sem saber muito bem o que fazer. Acabei por lhe perguntar: “Afinal como chegaste a este ponto? Porque foste despejada?
Já sentada no sofá, o velho sofá que tão bem conhecia e onde em tempos idos me beijara até não haver amanhã, disse: “Perdi o emprego à 10 meses, com a crise, a pandemia, a lay-off e para ajudar a empresa foi deslocada para a Eslováquia, tenho vivido com o subsidio de desemprego que entretanto acabou. Deixas-me ficar, por favor?! Não te vou dizer que é por dois ou três meses, não sei o tempo que vou precisar. Mas, deixas não deixas?!”
Saiu-me um sorriso, pela primeira vez senti um brilho nos seus olhos, levantei-me, pedi para ela se levantar também, ficámos defronte um ao outro.
- Podes ficar, sim! Dá-me um abraço.