quinta-feira, setembro 28, 2006

Arreganha a Taxa, Paga o Imposto!

A idade já não perdoa e apesar de ser ainda um jovem quarentão, ás vezes dói-me todo o corpo e as pernas também. De algum tempo para cá, o meu sistema hepático tem dado sinais de fraqueza – eu que só bebo tinto de uvas; cerveja de cevada e malte; champanhe francês; carne de porco com gordura natural; torresmos bem temperados; - será uma questão genética com certeza (agora me lembro ter comigo uma barriga de freira já meio marada – poderá ser isso).

Um dia da passada semana, lá fui a mais uma consulta de Hepatologia, ali no Hospital dos Covões. Ás 09 horas lá estava na fila das “marcações do dia”, caderneta de doente na mão, o cartão de saúde na outra mão, a carteira no bolso do blusão e uma pequena ansiedade ali algures para os lados do coração. Depois de 09 minutos e 23 segundos, mais alguns encontrões lá cheguei ao guichet, uma funcionária de olhos brilhantes, sorriso largo e voz dócil, pediu-me o cartão de doente, depois o cartão de saúde, confirmou-me a consulta para aquele dia e após esse procedimento “pediu-me” a carteira, quero dizer: o dinheiro da taxa moderadora – até aqui tudo normal!

Sentei-me na sala de espera eram 09, 15 horas, esperei, esperei, esperei, eu e o Pedro Barroso que me fez companhia e falou-me d’ “A história maravilhosa de um País bimbo”; pus-me a meditar (gosto de meditar nas salas de espera dos hospitais, também o faço na casa de banho durante o duche, sempre me ocorrem ideias frescas) e concluí que esperava e esperava, porque estava numa sala de espera. Pois claro! Sala de espera: espera! Está certo!...
Por volta das 11:15 horas, lá me chamaram (de novo a voz dócil) para outra sala, aliás corredor. O corredor de acesso aos consultórios. Exactamente ás 11:50 horas, sai um doente de um gabinete deixando a porta aberta e ouço uma voz rouca (já não dócil), chamando: MANUEL NEVES!!! Ufa!... Chegou minha vez de ser consultado, não era o meu médico habitual, mas tal como o meu médico habitual este também era limpinho, usava bata branca e tudo, estetoscópio ao pescoço, assim como que um ar a importância, gravata azul-bebé com elefantes cor-de-rosa, mas também descobri que o sapato do pé esquerdo estava ligeiramente sujo, contrastando com o do pé direito que brilhava como um espelho reflectindo o sol. A minha timidez tomou uma pequena dose de coragem e perguntei: - O Dr. Aristides hoje não está? Ao que respondeu: - Não se preocupe. Reparei como me olhou e só posso concluir que está ansioso. Não será caso para tanto, deve ter percebido que também sou médico e toda a sua história clínica está no sistema.
Quando falou em sistema, reparei que sobre a secretária estava uma caixa preta com um monitor em cima, daqueles fininhos, que pensava que só servia para ver os jogos de futebol, pelos menos lá na minha aldeia o Xico Zé da taberna, o filho do ti Malaquias, aquando do campeonato do Mundo comprou um. Mas é maior. O vinho deve dar dinheiro, pois o Xico Zé tem um televisor ou lá o que é, maior que o do médico. E o médico andou a estudar medicina na Universidade durante muitos anos, olha… valia mais ter ficado a aviar copos, pelos menos agora tinha um aparelho de ver a bola e a história clínica (programa do Dr. José Hermano Saraiva) maior.
Muito bem, o Sr. Dr. olhou, olhou para o sistema, levou o dedo ao ecran e repentinamente o retirou dizendo: - bolas! Apanhei um choque. Pensei de imediato que deve ter sido um choque tecnológico, pois um dia ouvi o Sr. Primeiro-ministro referir que estes choques também se apanham em monitores sobre estas caixas pretas, as caixas do sistema, portanto! Depois de pesquisar na tal história clínica, escreveu em dois papelinhos e disse: - faz estes exames e volta daqui a dois meses.
Saí muito mais tranquilo. Primeiro, fiquei sem saber se estava melhor ou pior. O que é bom, porque quererá dizer que estarei na mesma – ou seja: vivo! Segundo, o que aconteceria se me dissesse: - lá para o início do ano tem que ser internado para fazermos uma pequena intervenção cirúrgica. Bom, seria terrível. Não pela intervenção, pois quem me conhece sabe que não desmaio assim tão facilmente, mas, e as novas TAXAS de internamento e cirurgia. Sim, eu sei que são simbólicas; mas simbólicas é quanto?! Lá teria que propor ao Sr. Dr. para me internar de manhã, operar de manhã e mandar-me para casa depois de almoço. Já que teria de pagar a taxa daquele dia, pelo menos ia almoçado. Mas o doutor podia retrucar dizendo que corria risco de vida, que teria de ficar internado alguns dias até estabilizar. Perante este cenário teria eu que fazer algumas contas simples, a ver: número de dias internado x taxa de internamento + taxa de intervenção cirúrgica, por um lado; pelo outro, calcular o preço do meu funeral – subsidio de funeral - indemnização do seguro de vida que em tempos celebrei. Depois é simples, comparar um custo e outro e decidir: as TAXAS ou …

Fiquem bem.


PostScriptum: Não pensem muito. Viver é mesmo bom. Vão-se os anéis, ficam os dedos (provérbio popular), mas é pena.